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  • João Rangel

Independentemente, está tudo bem ser dependente?

Precisamos entender que sempre vamos precisar de ajuda pra carregar a nossa bagagem e resolver nossos BOs. E está tudo bem!


Não me considero uma Carrie Bradshaw em Nova Iorque no auge dos seus 30 anos, marcando presença em brunchs e festas, celebrando a independência e dividindo suas questões mais íntimas com as amigas. Não chego nem perto disso. Mas, um dia, quem sabe?


Brincadeiras à parte, esse textão de Facebook (será que posso chamar assim?) é uma reflexão sobre a independência humana. 


Tenho 22 anos e estou naquela fase de questionar o futuro, meus gostos, minhas escolhas e meu ciclo social. Quando coloco aquela música no volume máximo e deito na minha cama, os sentimentos vêm à tona acompanhados pela ansiedade, que me persegue há um bom tempo. Toda vez que recebo sua visita, ela me faz a pergunta: “o que será que te espera nos próximos anos?”. Respondo com o medo de sair de casa, da solidão e de não dar conta de tudo sozinho. A vida adulta não é fácil. Mas, ser adulto é ser independente? É ter que dar conta de tudo sozinho? 


O ser humano se torna independente, na minha visão, a partir das suas vivências. Meus pais se separaram quando eu tinha seis anos e sou filho único do casamento. Desde de muito cedo, tive a rotina de pular de casa em casa. Passar um fim de semana ali, outro, aqui. Fazia minha própria mochila, escolhia minhas roupas e selecionava, cuidadosamente, os jogos e os brinquedos que iriam me acompanhar pelos próximos dias.  Minha mãe sempre me jogou no mundo - claro que, ao mesmo tempo, nunca soltou minha mão - e me fazia lidar com meus próprios problemas. Lembro de uma vez em que tive que resolver uma questão burocrática relacionada ao meu CPF. Ela mandou eu ir sozinho ao centro da cidade e disse que, qualquer coisa, eu poderia ligar para ela.  Eu tinha 14 anos. 


Porém, a experiência que mais me transformou foi meu intercâmbio. Morei quase um ano em Sydney, na Austrália, em 2020. Interpreto esses 11 meses como um livro, cada um deles é um capítulo. Passei por muitas fases: quando me sentia mais introspectivo; quando a saudade de casa batia mais forte; quando a vontade de desbravar o novo país vinha com tudo. 


Foi só do outro lado do mundo que percebi o quanto eu conseguia ser independente e nem sabia. Morei com outros estrangeiros, dividíamos as tarefas do apartamento, mas era cada um por si. Ao longo da viagem, criei laços com pessoas maravilhosas. Umas da Europa, outras da Ásia, algumas brasileiras. Mas, muitas vezes, elas não tinham a mesma rotina que a minha. Então, comecei a aproveitar o tempo livre para fazer os programas que eu queria. Eu, Deus e o Google Maps. Ia ao cinema, à praia, ao shopping. 


Independência não é um problema
Foto: Reprodução/João Rangel

(Contando isso para vocês, percebo que a independência que eu tinha com 18 anos resultou em um processo de autoconhecimento extremamente crucial para o João de 2020 - e para o de hoje.)

Conversei com um amigo que daqui a alguns anos vai ser  psicólogo sobre a ideia de escrever esse texto e ele me aconselhou dar uma lida sobre a psicologia de grupo para Freud. Nunca tinha ouvido falar desse conceito, então, não sabia o que esperar. Segundo o psicanalista, quando os indivíduos estão em grupo, eles possuem a tendência de diminuir a consciência individual e serem vulneráveis à influência dos grupos. Essa influência do grupo pode afetar diretamente a capacidade desses indivíduos de agirem de forma independente. Em outras palavras, como seres humanos vivendo em sociedade, temos a tendência de sermos menos independentes.

Quem sou eu para discordar do pai da psicanálise? Existem pessoas mais independentes, claro, mas, no fim, somos todos dependentes de alguém ou de algo, em menor ou maior nível. Como disse, me considero um cara que anda junto com a independência. Mas, se pararmos para pensar, eu dependo dos meus pais financeiramente, do meu chefe para aprovar tudo o que eu faço no estágio, das minhas amizades, da minha família. 


Contar com outras pessoas não significa ser dependente
Foto: Reprodução/João Rangel

Por que será que existem pessoas mais dependentes do que outras? Será que é a idade? Realmente, não posso comparar a minha liberdade com a do meu irmão de 11 anos, por exemplo. Autoestima? Insegurança? 


Vagando pela internet, encontrei vários sites de profissionais que tratam dessa questão. Um deles utiliza até a frase: “a pior solidão é não estar à vontade consigo mesmo”, do escritor estadunidense Mark Twain. Segundo o texto, as pessoas se tornam cada vez mais dependentes emocionais quando não sabem valorizar sua própria companhia. Por isso, elas buscam a aceitação nos outros, por se enxergarem de forma negativa. A própria opinião não basta.

Faz bastante sentido. Afinal, existem pessoas que só se sentem bem quando as outras ao redor estão de bem com ela. Sendo sincero, eu sou assim, de certo modo. Já fui mais, porém, graças ao universo e ao tempo, percebi que precisava de ajuda e, sem pensar duas vezes, busquei terapia. Hoje noto que a forma que cuidamos de nós internamente impacta diretamente na nossa imagem e na forma que lidamos com as relações externas. 


Se por um acaso, você, leitor da Revista Zê, se identificar com essa questão, meu conselho é que você busque ajuda. Sei dos diversos preconceitos quando falamos de terapia, principalmente vindo daqueles mais conservadores e que acham “mi mi mi”. Mas, não se deixe levar. Existem muitos tipos de análises e avaliações. Tenho certeza que você pode se identificar com uma delas e se dar o valor que merece.


Depois desse desabafo, acho  que um dia, eu posso , sim, morar em Manhattan e viver intensamente e independente como a Carrie. Vou fazer sinal para o táxi na Times Square com o meu café preto na mão, ligar para a minha mãe todos os dias e dizer  que sinto falta dela. Está tudo bem ser dependente na medida certa, né? Afinal, independentemente de nossas vivências e crenças, somos independentes e dependentes ao mesmo tempo. Uma loucura.


Foto: montagem

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